Ao descrever a evolução do marketing da Pepsi-Cola, no prefácio do livro “Lifestyle & Event Marketing – Building the New Customer Partnership”*, Alan Pottasch, Vice-Presidente Senior da empresa, acaba fazendo um resumo da ópera da comunicação de marcas, na segunda metade deste século.
Ao final dos anos 50, milhares de norte-americanos se convertiam, a cada mês, em novos telespectadores. O custo da mídia começava a ganhar altura e surgiam as primeiras dúvidas quanto à sua eficácia: como as mensagens poderiam sobreviver e se destacar na “jungle of jingles”?
Diferenciação se tornou a palavra-chave do marketing da Pepsi. Primeira decorrência: novas embalagens e volumes, twist-off caps, etc. O efeito das novidades era fugaz. A concorrência adotava-as instantaneamente.
No início dos anos 60, a persistente busca de novos caminhos provoca um giro de exatos 180 graus no enfoque da comunicação: o produto sai de cena para dar lugar ao seu consumidor. Nascia o conceito “Pepsi Generation”, um dos resquícios arqueológicos do que viria a ser, posteriormente, denominado Lifestyle Marketing.
Por duas décadas, campanhas sucessivas associaram o produto às pessoas ativas, de espírito jovem, de bem com a vida, … A química funcionou. Fez sucesso. E se esgotou. No início dos anos 80, a “nova geração” entrava na 3ª idade e era internada na UTI de marketing da companhia. Diagnóstico: esclerose da artéria de comunicação.
A criatividade publicitária tinha esgotado seu estoque de símbolos virtuais. A credibilidade dos apelos estava em queda livre, elevando vertiginosamente o índice de resistência dos consumidores, já saturados.
Em 84, a Pepsi foi buscar na música pop a fórmula para expressar sua identidade. Com o lançamento de “Thriller”, no rastro do vídeo-clip, Michael Jackson se tornara um ícone global da “new generation”. Apesar de seu cacife de comunicador planetário, Mr. Jackson perambulava pelo mercado – tal qual artista brasileiro – em busca de patrocínio para sua turnê.
A Pepsi – que disputa mercado em mais de 150 países – percebeu a oportunidade de rejuvenescer a marca através de um símbolo concreto. Associar sua imagem à turnê era uma forma de comungar os valores da nova geração com os milhares de espectadores de cada show e os milhões de consumidores atingidos por sua divulgação.
Mas como mega-produto de massa, a Pepsi queria mais. Para maximizar o efeito da aliança, condicionou o patrocínio a um contrato de atuação do artista em campanhas publicitárias. Nada dos velhos e desgastados testemunhais. Michael Jackson faria o que sabe: entretenimento.
O êxito levou a companhia a ampliar seu cast – Tina Turner, David Bowie, Madonna, Cindy Crawford, Michael J. Fox, entre outros, e a estender suas ações de patrocínio a eventos como os Goodwill Games. Cada vez mais atenta, chegou a despachar uma equipe de VT para cobrir a queda do Muro de Berlim in loco, sem ter idéia do que faria com o material. Pouco depois, as imagens do happening cívico viravam um comercial, que se encerrava com a frase “Peace on Earth” – sobreposta a uma discretíssima assinatura da marca.
Alan Pottasch conclui o prefácio salientando que este tipo de programa não produz os efeitos instantâneos de venda das promoções “pague um e leve dois compre e concorra”. Mas ele credita à estratégia baseada no Lifestyle & Event Marketing, o notável aumento de share do produto entre os anos 60 e 90.
O que o executivo não disse, mas todos nós sabemos, é que os planos de vôo de sucesso sempre atravessam a turbulência dos riscos. O recente escândalo que envolveu Michael Jackson deve ter causado algum desconforto à tripulação da companhia que, no entanto, seguiu firme seu percurso. Nesta altura da rota, o artista era apenas uma entre as estrelas associadas à marca, que irradiavam valores vivenciados pelo mercado.
A trajetória da Pepsi-Cola – aqui resumida e interpretada – evidencia um fenômeno mercadológico em extraordinária expansão: nos últimos dez anos, as corporações norte-americanas elevaram os investimentos em patrocínios de US$ 300 milhões para mais de US$ 3 bilhões ao ano. Um dinheiro que entra na dança, no teatro, no cinema, na ópera, nos museus; movimenta modalidades esportivas; oxigena projetos ecológicos; enriquece programas para comunidades carentes.
Não se trata de um surto de benemerência empresarial. Companhias fazem negócios. Nos segmentos de mercado onde prevalece a concorrência, as características intrínsecas dos produtos se equivalem. As marcas tentam, há décadas, conquistar corações & mentes se valendo de atributos intangíveis. O arsenal de mensagens passivas de comunicação foi perdendo credibilidade ao longo do processo, obrigando as empresas a expressar valores através de atitudes.
Cada vez mais, busca-se estabelecer e fortalecer vínculos com os nichos de mercado por meio de ações que envolvam efetivamente a vida das pessoas, compartilhando suas culturas, hábitos, crenças, aspirações pessoais e sociais, comportamentos, formas de lazer e entretenimento…
Isto não significa o fim dos instrumentos tradicionais, mas sim uma poderosa forma de qualificar sua utilização, gerando de quebra – não custa lembrar – benefícios comunitários. As ações legitimam socialmente os valores propagados pelas campanhas.
É senso comum que a obesidade não é sinal de saúde. As dietas de comunicação baseadas exclusivamente nos carboidratos e proteínas da publicidade, promoção, marketing direto e relações públicas debilitam o organismo das marcas, levando-as à morte por insuficiência de vitaminas e sais minerais.