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2008: Básico 2. Atitude de Marca na Origem

Ao ouvir o nome dos Médicis, poderosa família da Florença renascentista, é quase impossível não fazer uma associação imediata com arte e arquitetura. Mas a fortuna e influência desta família estão longe de ter origem na estética. Os Médicis comandaram uma sólida rede bancária por quase um século, o que lhes garantiu domínio econômico e poder político. No entanto, o prestígio social só viria com o mecenato. A atitude de associar a “marca Médicis” a artistas como Michelangelo e Donatello conquistou simpatia histórica, gerando uma percepção positiva e reposicionando a imagem dos banqueiros. Com isso, o sobrenome Médicis se perpetuou como sinônimo de patrocínio às artes e não sobrou resquício de sua falência e extinção de linhagem. Esta é, sem dúvida, uma evidência do poder de expressão e persuasão de uma atitude de marca, ainda que praticada de forma intuitiva.

Como afirma o escritor Tim Parks no livro O Banco Médici – Poder, Dinheiro e Arte na Florença do Século XV, os séculos se passaram e as grandes instituições financeiras continuaram apostando no patrocínio como atitude, mas agora com objetivos e parâmetros bem definidos. Ao apoiar as artes, bancos como Itaú, HSBC e Unibanco criam uma conexão direta entre suas marcas e o universo do belo, do sensível, valores inestimáveis que permeiam o inconsciente coletivo. A diferença entre os patrocínios realizados na Renascença e no século 21 está focada no “como”. Em nosso tempo, o patrocínio é conceituado e planejado com intencionalidade e sua comunicação é dirigida de forma a potencializar a transferência de atributos da ação para a marca.

O conceito de atitude de marca tal qual conhecemos hoje é o resultado do processo de observação de pontos comuns entre situações aparentemente distintas. Entre outros exemplos, em um mesmo cenário um banco mantém um centro cultural; uma metalúrgica desenvolve um projeto de saúde pública; uma mineradora investe em um programa ambiental; um supermercado patrocina uma maratona; e uma cervejaria promove festivais de música. Essas atitudes, a princípio contrastantes, quando despidas de suas características aparentes revelam um mesmo objetivo e uma mesma estratégia: fortalecer vínculos afetivos de pessoas com marcas, realizando ações concretas, dissociadas de suas atuações comerciais diretas. A percepção desta essência uniforme possibilitou o desenvolvimento de um método único para planejar esses processos, aparentemente díspares.

A atitude de marca é uma estratégia de comunicação associativa na medida em que cria uma relação de transferência de significados entre a marca e a ação que realiza, o que Gareth Smith classifica, em seu artigo  Brand Image Transfer Through Sponsorship: A Consumer Learning Perspective, de TIM – Transferência de Imagem da Marca, quando a marca comercial e a marca da ação transferem seus atributos, uma para a outra, em ambos os sentidos. Quanto melhor planejados os fatores de alinhamento entre estas marcas, mais bem-sucedido será o processo de transferência de valores e de consolidação da identidade desejada. A força resultante decorre do princípio da atitude: a marca deve agir antes de falar.

Conceito-chave para a psicologia social, “atitude” vem do latim aptitudinem e representa a organização de experiências e comportamentos diante de uma situação específica; a junção entre opinião e conduta. A atitude distingue os indivíduos entre os que se limitam, simplesmente, a alardear sua visão de mundo e aqueles que canalizam sua energia para agir conforme sua visão de mundo. A concretude de sua ação gera credibilidade a seu discurso.

Da mesma forma, a atitude de marca tem a função básica de outorgar credibilidade aos processos de comunicação das empresas, na medida em que estabelece o fazer por premissa e a condição de se falar apenas sobre o que se faz. A diferenciação está no objeto da comunicação. Enquanto algumas marcas alegam o que são, ou pretendem ser; outras concretizam o que são, ou pretendem ser, a partir de ações que expressam sua essência. Na prática, enquanto uma marca se diz alinhada ao estilo de vida de seu público, outra participa dele diretamente; enquanto uma marca diz ser socialmente responsável, outra age e posiciona sua ação social no campo de percepção de seu público.

A atitude de marca é, simultaneamente, meio e mensagem. Atraído por uma atividade ou tema de seu interesse, o público entra em contato direto com a marca que, por sua vez, absorve os símbolos da própria atividade ou tema ao qual se associa. A atitude propicia a experiência da marca e gera afinidade por afetividade.

De alguma forma, os Médicis já sabiam disto.

 

Yacoff Sarkovas
Publicado na revista “Consumidor Moderno, em abril de 2008.