Qualquer mudança nas organizações depende do desejo, ação e inspiração de suas lideranças. Portanto, para promover a grande transformação necessária para construirmos uma economia sustentável e inclusiva – o maior desafio da humanidade no século 21 – é fundamental que as empresas sejam lideradas por profissionais que acreditem na causa e saibam conciliar os negócios com a preservação ambiental, a equidade social e a diversidade cultural.
Infelizmente, ainda hoje, vocação ou experiência em sustentabilidade é requisito somente para 4% das vagas de líderes não executivos e executivos seniores, segundo a Russell Reynolds. Este dado se encontra no estudo “Leadership for the Decade of Action”, lançado pelo Pacto Global das Nações Unidas, em parceria com esta consultoria de recursos humanos.
O trabalho tem por objetivo “ajudar as empresas a selecionar, promover e desenvolver seus próprios líderes” para que efetivem mudanças de paradigma nos negócios, cada vez mais necessárias e mais exigidas por parcela crescente de consumidores, colaboradores, investidores e da sociedade de forma geral.
Para realizar o estudo, foram selecionados, em todos os continentes e em múltiplos setores, 55 líderes seniores que conseguiram integrar sustentabilidade na estratégia de negócio de suas empresas, obtendo resultados comerciais.
Analisando a ação e o pensamento destes profissionais, captados por entrevistas em profundidade, foi construída uma “matriz de atributos dos líderes de mentalidade sustentável”, composta por quatro aspectos que revelam seus predicados-chave:
> Sistematização em múltiplos níveis: “Enfrentam os desafios complexos da sustentabilidade em colaboração com outras empresas, organizações da sociedade civil, academia e Governos.”
> Inclusão das partes interessadas: “Não “gerenciam” partes interessadas: as incluem. Para isto, demonstram altos níveis de empatia e autenticidade. E sempre que possível, procuram envolve-las ativamente na tomada de decisões e no compartilhamento de benefícios.”
> Inovação disruptiva: “Consideram que a transformação só se dá com mudanças exponenciais e a inovação do modelo de negócio. Buscam a melhor ciência disponível e não sentem desconforto por não ter todas respostas e lidar com o desconhecido.”
> Ativação a longo prazo: “Estabelecem metas audaciosas e implementam ações e investimentos para este fim. Possuem coragem e resiliência para manter o rumo nos contratempos e tomar decisões impopulares no curto prazo.”
O estudo afirma, com absoluta razão, que “para CEOs e membros do Conselho conduzirem efetivamente a transformação necessária a integrar sustentabilidade na estratégia do negócio, devem incorporá-la na cultura de liderança de suas organizações.”
Para isto, traz recomendações para concretizar a sustentabilidade nas estruturas e processos que definem como os líderes são selecionados, desenvolvidos, recompensados e promovidos:
> Seleção: “Garantir que conselhos e CEOs adotem como critérios-chave o potencial de liderança sustentável e o histórico de atuação sustentável para selecionar líderes seniores.”
> Desenvolvimento: “Tornar a mentalidade sustentável e os atributos para liderança sustentável foco central no desenvolvimento de lideranças e nas suas experiências cruciais.”
> Recompensa: “Integrar sustentabilidade nos objetivos, incentivos e remuneração dos membros do Conselho, CEOs e executivos.”
> Sucessão: “Incorporar conversas sobre potencial de liderança sustentável na estrutura de planejamento e gestão das sucessões”.
A publicação ainda tem como apêndice uma síntese do “SDG Implementation Framework”, trabalho anterior do Pacto Global das Nações Unidas, em parceria com a Accenture e a SAP.
Trata-se de um excelente roteiro para as empresas adotarem uma abordagem profunda, estratégica e integrada dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável – ODS, com recomendações em nove áreas, agrupadas em três diretrizes:
> Ancoragem da ambição sustentável na estratégia e governança;
> Integração profunda da sustentabilidade nas operações;
> Intensificação do engajamento das partes interessadas.
Não faltam evidências e diagnósticos que tornem os preceitos da sustentabilidade um imperativo para os humanos. Tampouco faltam instituições e articulações globais e locais, agendas de mudança, indicadores, metas e modelos bem-sucedidos de negócios sustentáveis.
No entanto, passados 20 anos da criação do Pacto Global, hoje endossado por 11.017 empresas de 157 países, e faltando 10 anos para atingirmos as metas da Agenda 2030, os desafios ainda são enormes.
No que tange ao papel e a responsabilidade das empresas, as intenções devem se tornar ações, numa escala e velocidade muito maior do que vem ocorrendo. Como o estudo feito pela Pacto Global com a Russell Reynolds aponta no seu prefácio, a chave para isto é “tornar a sustentabilidade sustentável.”
PS: Agradeço ao Heiko Hosomi Spitzeck, da Fundação Dom Cabral, pela indicação do estudo.